TST condena projeto da terceirização; mídia
silencia
publicado em 2 de setembro de 2013 às 20:50
Projeto de lei de Sandro Mabel
(PMDB-GO) libera a terceirização nas empresas, até quarteirização
Umberto: Ministros do TST condenam o PL
4330 e a mídia silencia
Numa decisão histórica, 19 ministros do
Tribunal Superior do Trabalho (TST) redigiram um parecer que condena em termos
duros e enfáticos o Projeto de Lei 4330/2004, que escancara a terceirização e
abre caminho a um dramático retrocesso na legislação e nas relações
trabalhistas do Brasil, comprometendo o mercado interno, a arrecadação
tributária, o SUS e o desenvolvimento nacional.
No dia 27 de agosto, os ministros
encaminharam ofício à Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC)
da Câmera Federal anunciando a posição e denunciando o risco de “gravíssima
lesão de direitos sociais, trabalhistas e previdenciários no País” e redução do
“valor social do trabalho”.
Apesar da relevância do tema e da
inegável autoridade do tribunal, a mídia hegemônica não se interessou pelo
fato, que é um petardo contra o PL 4330, do deputado Sandro Mabel, um
capitalista (ou empresário, para quem prefere o eufemismo) de Goiás. O
comportamento da mídia não surpreende, mas o silêncio sepulcral diz muito sobre
o caráter de classe daquilo que antigamente costumávamos chamar de imprensa
burguesa, cujos proprietários têm interesse direto na precarização do trabalho
e foram os que mais choraram o veto do ex-presidente Lula à famosa Emenda 3.
Terceirização é um estupro
A terceirização é “um estupro da classe
trabalhadora”, conforme a indignada e justa definição do presidente do
Sindicato Nacional dos Marítimos (Sindmar) e vice-presidente da CTB, Severino
Almeida. É um instrumento do capital, em seu afã insaciável de maximizar os
lucros, para eliminar direitos, reduzir salários, dividir as categorias e
enfraquecer os sindicatos.
Estudo recente do Dieese e da CUT
mostra que o terceirizado fica 2,6 anos a menos no emprego, tem uma jornada de
três horas semanais a mais e ganha 27% menos do assalariado contratado
diretamente pela empresa. Ou seja, a terceirização, que integra a ofensiva
neoliberal do capitalismo, propicia um aumento dramático da taxa de exploração
da classe trabalhadora, a taxa de mais valia pesquisada por Karl Marx.
O pretexto para escancarar a
terceirização é a busca de maior competitividade e produtividade do trabalho,
que na concepção dos capitalistas se faz depreciando o valor da força de
trabalho. Mas os defensores do projeto são capazes de jurar de cara limpa e pés
juntos que querem proteger seus funcionários. Haja cinismo.
Um pronunciamento vigoroso
A Justiça do Trabalho nem sempre
favoreceu os interesses dos assalariados, mas o pronunciamento dos 19 ministros
do TST sobre o PL 4330 revela muito mais firmeza, ciência, sabedoria e coragem
do que as próprias centrais sindicais e alguns líderes de partidos políticos
que dizem representar a classe trabalhadora, mas parecem meio perdidos nas
brumas ilusórias da conciliação de classes.
O movimento sindical luta para impedir
a aprovação do monstrengo capitalista construído por Mabel. A campanha nacional
por sua rejeição integra a Pauta Trabalhista propagada nas manifestações
nacionais realizadas nos dias 11 de julho, 6 de agosto e no último dia 30.
Nesta terça-feira, 3, a CTB (Central
dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil) promove atos em vários aeroportos
do país alertando o povo brasileiro para a necessidade de ampliar a mobilização
e luta contra a proposta.
Reproduzo abaixo a íntegra do ofício
enviado à CCJC para que os leitores e leitoras façam seu próprio julgamento,
reflitam sobre os riscos embutidos na PL do capitalista Mabel e contribuam para
estabelecer a verdade dos fatos e desmascarar as reais intenções do autor, da
CNI e outras entidades patronais que fazem forte lobby no Congresso pela
aprovação do projeto. O documento dos ministros é esclarecedor e merece amplo
apoio e propaganda. Ajude a divulgá-lo e a enfrentar a conspiração do silêncio
da mídia burguesa.
“Brasília, 27 de agosto de 2013
Excelentíssimo Senhor deputado Décio
Lima
Presidente da Comissão de Constituição
e Justiça e de Cidadania
A sociedade civil, por meio de suas
instituições, e os órgãos e instituições do Estado, especializados no exame das
questões e matérias trabalhistas, foram chamados a opinar sobre o Projeto de
Lei nº 4.330/2004, que trata da terceirização no Direito brasileiro.
Em vista desse chamamento, os Ministros
do Tribunal Superior do Trabalho, infra-assinados, com a experiência de várias
décadas na análise de milhares de processos relativos à terceirização
trabalhista, vêm, respeitosamente, apresentar suas ponderações acerca do
referido Projeto de Lei:
I. O PL autoriza a generalização plena
e irrefreável da terceirização na economia e na sociedade brasileiras, no
âmbito privado e no âmbito público, podendo atingir quaisquer segmentos
econômicos ou profissionais, quaisquer atividades ou funções, desde que a
empresa terceirizada seja especializada.
II. O PL negligencia e abandona os
limites à terceirização já sedimentados no Direito brasileiro, que consagra a
terceirização em quatro hipóteses:
1- Contratação de trabalhadores por
empresa de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.06.1974);
2- Contratação de serviços de vigilância (Lei n 7.102, de 20.06.1983);
3- Contratação de serviços de conservação e limpeza;
4- Contratação de serviços especializados ligados a atividades-meio do tomador,
desde que inexista a personalidade e a subordinação direta;
III. A diretriz acolhida pelo PL nº
4.330-A/2004, ao permitir a generalização da terceirização para toda a economia
e a sociedade, certamente provocará gravíssima lesão social de direitos
sociais, trabalhistas e previdenciários no País, com a potencialidade de
provocar a migração massiva de milhões de trabalhadores hoje enquadrados como
efetivos das empresas e instituições tomadoras de serviços em direção a um novo
enquadramento, como trabalhadores terceirizados, deflagrando impressionante
redução de valores, direitos e garantias trabalhistas e sociais.
Neste sentido, o Projeto de Lei esvazia
o conceito constitucional e legal de categoria, permitindo transformar a grande
maioria de trabalhadores simplesmente em ´prestadores de serviços´ e não mais
´bancários´, ´metalúrgicos´, ´comerciários´, etc.
Como se sabe que os direitos e
garantias dos trabalhadores terceirizados são manifestamente inferiores aos dos
empregados efetivos, principalmente pelos níveis de remuneração e contratação
significativamente mais modestos, o resultado será o profundo e rápido
rebaixamento do valor social do trabalho na vida econômica e social brasileira,
envolvendo potencialmente milhões de pessoas.
IV. O rebaixamento dramático da
remuneração contratual de milhões de concidadãos, além de comprometer o bem
estar individual e social de seres humanos e famílias brasileiras, afetará
fortemente, de maneira negativa, o mercado interno de trabalho e de consumo,
comprometendo um dos principais elementos de destaque no desenvolvimento do
País. Com o decréscimo significativo da renda do trabalho ficará comprometida a
pujança do mercado interno no Brasil.
V. Essa redução geral e grave da renda
do trabalhador brasileiro – injustificável, a todos os títulos – irá provocar
também, obviamente, severo problema fiscal para o Estado, ao diminuir, de modo
substantivo, a arrecadação previdenciária e tributária no Brasil.
A repercussão fiscal negativa será
acentuada pelo fato de o PL provocar o esvaziamento, via terceirização
potencializada, das grandes empresas brasileiras, que irão transferir seus
antigos empregados para milhares de pequenas e médias empresas – todas
especializadas, naturalmente -, que serão as agentes do novo processo de
terceirização generalizado.
Esvaziadas de trabalhadores as grandes
empresas – responsáveis por parte relevante da arrecadação tributária no Brasil
-, o déficit fiscal tornar-se-á também incontrolável e dramático, já que se
sabe que as micro, pequenas e médias empresas possuem muito mais proteções e incentivos
fiscais do que as grandes empresas. A perda fiscal do Estado brasileiro será,
consequentemente, por mais uma razão, também impressionante. Dessa maneira, a
política trabalhista extremada proposta pelo PL 4.330-A/2004, aprofundando,
generalizando e descontrolando a terceirização no País, não apenas reduzirá
acentuadamente a renda de dezenas de milhões de trabalhadores brasileiros, como
também reduzirá, de maneira inapelável, a arrecadação previdenciária e fiscal
da União no País.
VI. A generalização e o aprofundamento
da terceirização trabalhista, estimulados pelo Projeto de Lei, provocarão
também sobrecarga adicional e significativa ao Sistema Único de Saúde (SUS), já
fortemente sobrecarregado. É que os trabalhadores terceirizados são vítimas de
acidentes do trabalho e doenças ocupacionais/profissionais em proporção muito
superior aos empregados efetivos das empresas tomadoras de serviços. Com a
explosão da terceirização – caso aprovado o PL nº 4.330-A/2004 -,
automaticamente irão se multiplicar as demandas perante o SUS e o INSS.
São essas as ponderações que
apresentamos a Vossa Excelência a respeito do Projeto de Lei nº 4.330-A/2004,
que trata da ´Terceirização’
Respeitosamente,
Seguem as assinaturas dos ministros
Antonio José de Barros Levenhagen; João Oreste Dalazen; Emmanoel Pereira; Lelio
Bentes Corrêas; Aloysio Silva Corrêa da Veiga; Luiz Philippe Vieira de Mello
Filho; Alberto Luiz Bresciane de Fontan Pereira; Maria de Assis Calsing;
Fernando Eizo Ono; Marcio Eurico Vitral Amaro; Walmir Oliveira da Costa;
Maurício Godinho Delgado; Kátia Magalhães Arruda; Augusto Cesar Leite de
Carvalho; José Roberto Freire Pimenta; Delaílde Alves Miranda Arantes; Hugo
Carlos Sheurmann; Alexandre de Souza Agra Belmonte e Claudio Mascarenhas
Brandão.
*Umberto Martins é jornalista e
assessor da Presidência da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil
(CTB)
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